• A palavra “Igreja” não aparece no Apocalipse depois do capítulo 3
Esse é o típico argumento do bumerangue. O bumerangue é um objeto de arremesso criado para voltar à mão do arremessador quando não atinge o alvo. E é exatamente isso que ocorre com este “argumento” dos pré-tribulacionistas: volta-se contra eles mesmos.
Primeiro, se o fato de a palavra “Igreja” não ser citada nos capítulos 6-18 (período da tribulação) significa que ela não estará na terra neste período, então o fato de ela também não aparecer nos capítulos 19-21 deveria significar que ela também não estará na terra durante o milênio, já que ela também não aparece nestes capítulos, quando, de acordo com a cronologia elaborada por eles, a Igreja já deveria ter descido para viver o milênio aqui. Isso por si só já basta para mostrar que tal argumento não vale nada.
Segundo, a palavra “Igreja” nunca aparece no Apocalipse no sentido utilizado nas epístolas, como o Corpo de Cristo invisível e universal, mas apenas como referência às igrejas locais na Ásia, porque foi para quem João destinou o Apocalipse, originalmente. Em outras palavras, a Igreja como um todo nunca é mencionada no Apocalipse, nem antes e nem depois da tribulação, então por essa ótica dispensacionalista deveríamos crer que a Igreja como um todo não existe ou que ela foi arrebatada antes mesmo da “vinda secreta”!
A terceira prova de que tal argumento é um bumerangue é porque a palavra “Igreja” também não aparece quando se fala das coisas no Céu no Apocalipse. Ou seja: se o fato de a palavra “Igreja” não aparecer quando o Apocalipse fala das coisas que ocorrerão na terra significa que a Igreja não estará na terra, então o fato de a palavra Igreja também não aparecer em lugar nenhum quando o Apocalipse fala das coisas que ocorrerão no Céu deve significar que a Igreja também não estará no Céu. Por essa lógica, a Igreja não estaria em lugar nenhum!
E a quarta e final prova é que a palavra “Igreja” não precisa aparecer quando se está falando da Igreja! Quando num púlpito alguém diz “irmãos”, sabemos que ele está falando da Igreja, porque “irmãos” é uma terminologia empregada para os irmãos em Cristo, ou seja: cristãos. O mesmo ocorre com outras palavras que também se aplicam à Igreja, tais como “santos”, “servos de Deus” e “eleitos”.
Da mesma forma que ninguém precisa necessariamente usar a palavra “Satanás” quando se refere a ele, mas pode perfeitamente usar sinônimos como “demônio”, “maligno” e “diabo”, ninguém precisa usar apenas o termo “Igreja” para se referir aos cristãos, pois estes outros termos (irmãos, santos, eleitos, servos) se aplicam a eles. E eles aparecem abundantemente no Apocalipse em plena tribulação, como referência aos que estão na terra:
“Também lhe foi permitido fazer guerra aos santos, e vencê-los; e deu-se-lhe autoridade sobre toda tribo, e povo, e língua e nação. E adorá-la-ão todos os que habitam sobre a terra, esses cujos nomes não estão escritos no livro do Cordeiro que foi morto desde a fundação do mundo. Se alguém tem ouvidos, ouça. Se alguém leva em cativeiro, em cativeiro irá; se alguém matar à espada, necessário é que à espada seja morto. Aqui está a perseverança e a fé dos santos” (Apocalipse 13:7-10)
O texto acima descreve o período tribulacionista e fala da presença de santos, contra os quais a besta irá fazer guerra. Que santos seriam esses, se a Igreja já estaria arrebatada, no Céu? Os pré-tribulacionistas são obrigados a crerem que em todas as ocasiões onde a palavra “santos”, “eleitos” e “servos de Deus” aparecem no Apocalipse se refira somente aos israelitas, esquecendo-se de que na esmagadora maioria das ocasiões em que eles aparecem no NT é como uma referência à Igreja, e não aos israelitas!
Qualquer dispensacionalista que abra a Bíblia nas epístolas ou nos evangelhos e leia a palavra “santos” irá imediatamente associar à Igreja sem problema algum, mas quando ele vê o mesmo ocorrendo no Apocalipse ele tem uma imensa dificuldade em aceitar o fato de que é à Igreja que o texto está se referindo, porque eles já tem a mentalidade pré-concebida de que não se pode tratar da Igreja de jeito nenhum.
Ou seja: não é através de uma exegese que eles chegam à conclusão de que os santos do Apocalipse não são a Igreja, mas sim através de suas próprias premissas, necessárias para dar algum sentido à crença dispensacionalista. Já o pós-tribulacionista está livre para analisar a Bíblia honestamente e identificar “santos” como a Igreja da mesma forma que ele identificaria o mesmo nas epístolas, o que é claramente a leitura mais natural do texto.
Os pré-tribulacionistas estão presos em seu próprio sistema, dentro de suas próprias interpretações, o que os obriga a rejeitar a priori qualquer coisa, por mais óbvia que seja, que contrarie sua teologia, ainda que em outros locais da Bíblia eles aceitem tais fatos sem contestação, pois não afetam sua crença em um arrebatamento pré-tribulacional. Trata-se de uma visão tendenciosa e manipulada da Bíblia, limitando a interpretação aos limites permitidos pelo dispensacionalismo, e não de uma leitura honesta e natural do texto.
No capítulo seguinte, Deus volta a reiterar o mesmo pensamento, sobre a necessidade de perseverança dos santos na grande tribulação:
“Aqui está a perseverança dos santos, daqueles que guardam os mandamentos de Deus e a fé em Jesus” (Apocalipse 14:12)
No meio da mais tensa tribulação, Deus diz que tinha um povo ali:
“Porque todas as nações têm bebido do vinho da ira da sua prostituição (queda da Babilônia), e os reis da terra se prostituíram com ela; e os mercadores da terra se enriqueceram com a abundância de suas delícias. Ouvi outra voz do céu dizer: Sai dela, povo meu, para que não sejas participante dos sete pecados, e para que não incorras nas suas pragas” (Apocalipse 18:3,4)
Em Mateus 24:22 Jesus diz que os eleitos estarão na grande tribulação:
“Se aqueles dias não fossem abreviados, ninguém sobreviveria; mas, por causa dos eleitos, aqueles dias serão abreviados” (Mateus 24:22)
É digno de nota que em absolutamente todas as vezes em que a palavra “eleitos” é usada no NT é em relação à Igreja, e não aos judeus. Na verdade, Paulo até mesmo chega a traçar um contraste neste ponto:
“Pois quê? O que Israel busca, isso não o alcançou; mas os eleitos alcançaram; e os outros foram endurecidos” (Romanos 11:7)
O contraste deixa claro que os eleitos são a Igreja, os cristãos, e não Israel. Todos os israelitas que se convertem passam a fazer parte deste grupo de eleitos – a Igreja –, junto aos gentios que também creem em Cristo, e, portanto, é à Igreja que Jesus se referia em Mateus 24:22. Não se trata de israelitas não-cristãos, nem de incrédulos ou de falsos crentes que forem “deixados para trás”. É o texto mais claro de que a Igreja estará na grande tribulação, pois a palavra “eleitos” nunca foi usada no NT para se referir a outra coisa senão à Igreja!
Em Daniel também temos um retrato semelhante ao que João nos traz no Apocalipse:
“Eu olhava e eis que este chifre fazia guerra contra os santos e prevalecia contra eles, até que veio o Ancião de Dias e fez justiça aos santos do Altíssimo; e veio o tempo em que os santos possuíram o reino. Proferirá palavras contra o Altíssimo, e consumirá os santos do Altíssimo; cuidará em mudar os tempos e a lei; os santos lhe serão entregues na mão por um tempo, e tempos, e metade de um tempo. Mas o tribunal se assentará em juízo, e lhe tirará o domínio, para o destruir e para o desfazer até o fim” (Daniel 7:21-26)
Note que, quando Daniel fala do tempo da grande tribulação (“um tempo, e tempos, e metade de um tempo”), ele nada fala sobre os santos estarem fora dela, sobre serem raptados ou arrebatados secretamente. Ao contrário: diz que serão entregues nas mãos do anticristo, que durante algum tempo inclusive prevalecerá contra eles, mas Cristo virá em auxílio deles e lhes dará a vitória, fazendo justiça pelos seus santos. É a Igreja presente na grande tribulação o tempo todo, o que só não é perceptível para aquele que já está pré-disposto a rejeitar este fato.
• A diferença entre “harpazo” e “parousia”
Os pré-tribulacionistas tentam, através de uma diferenciação de nomenclatura, afirmar que arrebatamento no grego é “harpazo” e a segunda vinda é a “parousia”, como se fossem duas coisas diferentes, em eventos diferentes. Para eles, harpazo (arrebatamento) ocorre no início da tribulação, enquanto a parousia (vinda visível) ocorre ao final da tribulação, depois dos sete anos. Este argumento falha exatamente em não considerar que o harpazo ocorre na parousia, ou seja: que o arrebatamento ocorre na vinda visível de Cristo. Isso fica provado pelo fato de que o termo parousia é usado tanto para se referir à vinda visível como também quando se refere ao arrebatamento.
Por exemplo, no texto de 1ª Tessalonicenses 4:15, que está no mesmo contexto do arrebatamento-harpazo, Paulo emprega o termo parousia:
“Dizemo-vos, pois, isto, pela palavra do Senhor: que nós, os que ficarmos vivos para a vinda [parousia] do Senhor, não precederemos os que dormem. Porque o mesmo Senhor descerá do céu com alarido, e com voz de arcanjo, e com a trombeta de Deus; e os que morreram em Cristo ressuscitarão primeiro. Depois nós, os que ficarmos vivos, seremos arrebatados [harpazo] juntamente com eles nas nuvens, a encontrar o Senhor nos ares, e assim estaremos sempre com o Senhor” (1ª Tessalonicenses 4:15-17)
Perceba que Paulo não está falando de dois eventos distintos, separados por sete anos, ao contrário: está descrevendo um mesmo evento, e diz que nós ficaremos vivos até a parousia do Senhor! Portanto, se a parousia é a vinda visível ao final dos sete anos, então Paulo está sendo explicitamente pós-tribulacionista, pois diz que nós ficaremos vivos até lá! Isso fulmina com as pretensões dispensacionalistas que tem por base uma superficial distinção entre harpazo e parousia, quando, na verdade, uma leitura básica em 1ª Tessalonicenses 4:15-17 nos mostra claramente que o harpazo ocorre na parousia!
Paulo usa o termo parousia tanto em relação ao dia do arrebatamento (1Ts.4:15) como também em relação ao dia da volta visível de Jesus, quando ele destruirá o anticristo “pela manifestação da sua vinda – katargêsei tê epiphaneia tês parousias autou” (2Ts.2:8). Ou seja: para Paulo, parousia significa tanto o dia do arrebatamento como também o dia da vinda visível ao final da tribulação, porque, para ele, não existia tal distinção, pois era exatamente na parousia que ocorreria o harpazo!
• Alívio quando o Senhor Jesus for revelado
Paulo afirma em 2ª Tessalonicenses 1:6-10:
“É justo da parte de Deus retribuir com tribulação aos que lhes causam tribulação, e dar alívio a vocês, que estão sendo atribulados, e a nós também. Isso acontecerá quando o Senhor Jesus for revelado lá do céu, com os seus anjos poderosos, em meio a chamas flamejantes. Ele punirá os que não conhecem a Deus e os que não obedecem ao evangelho de nosso Senhor Jesus. Eles sofrerão a pena de destruição eterna, a separação da presença do Senhor e da majestade do seu poder. Isso acontecerá no dia em que ele vier para ser glorificado em seus santos e admirado em todos os que creram, inclusive vocês que creram em nosso testemunho” (2ª Tessalonicenses 1:6-10)
Paulo está falando do dia em que nós receberemos alívio da parte de Deus, que ocorrerá quando o Senhor Jesus Cristo for revelado. Para os pré-tribulacionistas isso ocorre na suposta “vinda secreta” sete anos antes da tribulação, enquanto os pós-tribulacionistas creem que isso ocorre no final da grande tribulação, na vinda visível, que é a única segunda vinda de Jesus.
Quem está com a razão?
Uma exegese simples do texto aponta claramente para o pós-tribulacionismo. Paulo não poderia estar se referindo a um arrebatamento secreto pré-tribulacional por diversas razões. Em primeiro lugar, porque o texto não fala de um arrebatamento secreto, silencioso, mas de um com um enorme barulho. Paulo disse aos tessalonicenses que no dia do arrebatamento Jesus desceria do Céu ao som de um “alarido” (1Ts.4:16), que significa um “barulho excessivo; que está repleto de ruídos; muitas vozes em simultâneo; gritaria, berreiro, algazarra”[1]. Ela vez da palavra grega keleuma, que significa “um grito de estímulo; uma convocação em voz alta”[2].
Portanto, não se trata de uma vinda silenciosa, como creem os pré-tribulacionistas, mas de uma vinda “barulhenta”. O texto de Paulo aos tessalonicenses também faz menção ao som do arcanjo (1Ts.4:16) e à trombeta de Deus (1Ts.4:16), todos elementos que passam vividamente a imagem de uma volta estrondosa.
Essa vinda que Paulo se refere também tem que ser visível, porque ele faz menção às “chamas flamejantes” (2Ts.1:7) que serão reveladas do Céu, além de descer com os seus “anjos poderosos” (2Ts.1:7), o mesmo que ocorre na volta gloriosa de Cristo ao término da grande tribulação (Mt.24:30,31), porque se trata do mesmo evento, e não de eventos diferentes. Ele também diz no verso 7 que, neste dia, o Senhor Jesus será revelado nos céus. Portanto, não se trata de uma vinda secreta, mas da própria revelação de Jesus Cristo, quando “todo olho o verá” (Ap.1:7).
Ele usa a palavra grega “apokalupsis”, que é de onde provém o termo “Apocalipse”, que significa exatamente o inverso de uma vinda em secreto, como diz a Concordância de Strong:
602 αποκαλυψις apokalupsis
de 601; TDNT - 3:563,405; n f
1) ato de tornar descoberto, exposto.
2) uma revelação de verdade, instrução.
2a) concernente a coisas antes desconhecidas.
2b) usado de eventos nos quais coisas, estados ou pessoas até agora não presentes na mente.
das pessoas se tornam parte da sua realidade.
3) manifestações, aparecimento.
Os pré-tribulacionistas afirmam que a vinda de Jesus no arrebatamento será secreta, em oculto, mas Paulo diz exatamente o contrário! Neste dia Jesus será revelado, manifesto, tornado exposto, é precisamente o ato de se tornar descoberto o que antes era desconhecido!
Finalmente, a prova final no contexto deste texto de 2ª Tessalonicenses que prova que a vinda de Jesus no dia do arrebatamento será visível e não secreta está nos versos 8 e 9, que dizem: “Ele punirá os que não conhecem a Deus e os que não obedecem ao evangelho de nosso Senhor Jesus. Eles sofrerão a pena de destruição eterna, a separação da presença do Senhor e da majestade do seu poder” (vs.8,9).
Se essa volta de Jesus ocorresse sete anos antes do fim da tribulação, então Paulo teria dito que a punição aos ímpios seriam estes sete anos da tribulação apocalíptica. Mas ele em lugar nenhum faz menção a esta “punição”, mas sim à morte eterna, a destruição para sempre (v.9) que ocorrerá no dia do Juízo, que se dá na vinda visível de Cristo (2Tm.4:1).
Isso está totalmente de acordo com a teologia pós-tribulacionista, pois Jesus volta no fim da tribulação no mesmo dia em que os ímpios serão julgados e condenados à destruição eterna, mas não está de acordo com o pré-tribulacionismo, em que os ímpios ainda viverão outros sete anos antes que esse juízo de condenação aconteça.
Paulo diz que isso (a destruição eterna, que ocorrerá após o juízo) acontecerá “quando Jesus vier para ser glorificado nos seus santos, e para se fazer admirável naquele dia em todos os que crêem” (v.10). Os dispensacionalistas creem que este dia ocorrerá no início da tribulação, o que não pode ser verdade, já que no início da tribulação os ímpios não irão para a morte eterna, eles só serão condenados depois da tribulação!
Portanto, todo o contexto de 2ª Tessalonicenses 1:6-10 aponta indiscutivelmente ao pós-tribulacionismo como a crença correta, e refuta todas as pretensões de Darby e sua nova doutrina. O texto, diante de seu devido contexto, deixa claro que o nosso alívio virá quando Jesus for revelado no final da grande tribulação, e não no começo dela.
• A tribulação é somente para os judeus
Mesmo que fosse, e daí? A “tribulação” que abateu os egípcios nas dez pragas do Egito vieram apenas sobre eles, mas nem por isso Israel – ou as outras nações, que não tinham nada a ver com aquilo – foram “tiradas do planeta” por causa disso. Mesmo quando Deus decidiu destruir o mundo inteiro com um dilúvio, ele não optou por arrebatar Noé e sua família para depois de a chuva passar colocá-los de volta a salvos em terra firme (como pensam os pré-tribulacionistas quanto à tribulação, em que os salvos seriam arrebatados, ficariam no Céu enquanto o circo pega fogo na terra e voltariam a ela depois para passarem o milênio), mas optou pelo contrário: deixar Noé e sua família o tempo todo neste planeta, embora protegidos por Deus das catástrofes.
Assim sendo, o fato de a tribulação ser em primeiro lugar para provar os israelitas não implica de modo nenhum que a Igreja tenha de ser tirada da terra. O dilúvio também não era para condenar Noé e sua família, mas eles não foram tirados da terra por isso. As pragas do Egito também não eram para provar os israelitas, mas eles não foram tirados da terra por isso. O mesmo pode-se dizer do fogo que caiu sobre Sodoma e Gomorra, dos sete anos de fome no Egito, da batalha entre Jerusalém e Roma em 70 d.C, enfim: de toda a história humana. Deus nunca precisou tirar povo algum do planeta para exercer seu juízo sobre outros povos.
Nunca é exaustivo lembrar-se da oração de Cristo: “não rogo que os tires do mundo, mas que os guardes do Maligno” (Jo.17:15). O plano de Deus sempre envolveu guardar, e não tirar. Mesmo quando o “alvo” principal não eram os cristãos. Portanto, responder a esta pergunta é tão simples quanto fez Gyordano Montenegro quando desafiado sobre o porquê que a grande tribulação é chamada de dia de angústia para Jacó: “Porque são dias de angústia para Jacó. Qual é o problema?”[3]
• Deus não deixaria a Igreja passar por uma grande tribulação
Este é o famoso argumento passional. “A Igreja não vai passar pela tribulação porque Deus não permitiria isso, porque Deus é amor...”. O fato de Deus ser amor, ser do bem, ser misericordioso, ser justo e ser cheio de graça e de bondade nunca o impediu de permitir que os cristãos passassem por grandes perseguições no passado, e, de fato, até hoje. Isso foi em primeiro lugar garantido pelo próprio Senhor Jesus, que disse:
“Se o mundo vos odeia, sabei que, primeiro do que a vós, me odiou a mim. Se fôsseis do mundo, o mundo amaria o que era seu; mas, porque não sois do mundo, antes eu vos escolhi do mundo, por isso é que o mundo vos odeia. Lembrem-se da palavra que eu vos disse: Não é o servo maior do que o seu senhor. Se a mim me perseguiram, também vos perseguirão a vós; se guardaram a minha palavra, guardarão também a vossa” (João 15:18-20)
Paulo foi além e declarou:
“É necessário que passemos por muitas tribulações para entrarmos no Reino de Deus” (Atos 14:22)
O meu livro “Chamados para crer e sofrer”[4] foi produzido exclusivamente para refutar a tese de que o crente não pode sofrer, e possui um enorme compêndio de citações bíblicas e históricas dos cristãos de ontem e de hoje sofrendo perseguição, tribulação, humilhação e martírio. Se alguém acha que Deus deve nos poupar de encarnar uma tribulação no futuro, deveria em primeiro lugar olhar para a vida dos apóstolos de Jesus.
A história nos mostra que todos os doze apóstolos, excetuando Judas e João, morreram martirizados. Mateus morreu na Etiópia como mártir. André foi crucificado em uma cruz em forma de xis para que o seu sofrimento se prolongasse. Filipe foi enforcado de encontro a um pilar em Hierápolis. Bartolomeu foi morto a chicotadas e seu corpo foi colocado num saco e jogado ao mar. Simão morreu crucificado junto aos zelotes em 70 d.C. Tiago foi martirizado em 62 d.C por ordem do sumo sacerdote Ananias, apedrejado até a morte por se recusar a denunciar os cristãos.
Judas Tadeu foi martirizado na Pérsia junto a Simão Zelote. Pedro pediu para ser crucificado de cabeça para baixo por julgar-se indigno de morrer na mesma posição que seu Mestre. O outro Tiago foi decapitado em Jerusalém por Herodes Agripa em 44 d.C. João chegou a ser lançado em um caldeirão de azeite a ferver. Tomé morreu a flechadas enquanto orava, por ordem do rei de Milapura, em 53 d.C. Paulo morreu decapitado no mesmo ano que Pedro. Lucas foi enforcado em uma oliveira na Grécia. Matias foi martirizado na Etiópia.
Faltar-nos-ia tempo para citar a crueldade de Nero em sua perseguição aos cristãos. Tácito[5] disse que “eles foram feitos objetos de esporte, pois foram amarrados nos esconderijos de bestas selvagens e feitos em pedaços por cães, ou cravados em cruzes, ou incendiados, e, ao fim do dia, eram queimados para servirem de luz noturna”[6]. Suetônio[7] disse que “os cristãos, espécie de gente dada a uma superstição nova e perigosa, foram destinados ao suplício”[8]. Josefo[9] descreveu o martírio de Tiago, irmão de Jesus, dizendo que foi apedrejado[10]. Plínio[11] também narrou várias formas de interrogamento, tortura e morte dos que se diziam cristãos[12].[13]
Os tempos passaram, mas os cristãos continuaram sendo duramente perseguidos e atribulados até a liberdade de culto estabelecida no Édito de Milão (313 d.C) e a união com o império romano sob Teodósio I, no Édito de Tessalônica (380 d.C), quando o Cristianismo se tornou a religião oficial do império. Mas isso não foi o fim: a inquisição papal medieval tratou de perseguir os verdadeiros cristãos por séculos, chegando a assassinar aproximadamente cinco milhões deles[14].
Até hoje há cristãos perseguidos nos países comunistas e islâmicos. Estima-se que anualmente entre 100 e 200 mil cristãos morram por causa da sua fé. Essa quantidade de mártires mostra que estamos passando pela maior era de perseguição religiosa de todos os tempos. Isso pode parecer distante para alguém que vive em um país cristão e democrático no Ocidente, mas é a realidade para os que vivem como cristãos em muitos países do Oriente.
Portanto, o fato de Deus ser amor nunca o impediu de permitir que os cristãos de todas as eras não fossem poupados das tribulações. Uma grande tribulação aqui no Brasil poderia ser um espanto para algum brasileiro que não está nem um pouco familiarizado com a verdadeira perseguição religiosa que há no mundo, mas em locais como a Coreia do Norte, onde aproximadamente 50 a 70 mil cristãos estão presos em campos de concentração por causa de sua fé, e dezenas de milhares de cristãos são assassinados anualmente naquele país[15], seria apenas o cumprimento da rotina.
A palavra de Deus é clara em dizer que Deus livra os justos de todas as suas tribulações (Sl.34:17), mas mesmo assim em toda a história humana milhões de justos já foram torturados e mortos. Jesus nos disse que nos guardaria do maligno (Jo.17:15), que nos livraria do mal (Mt.6:13) e que estaria conosco até a consumação dos séculos (Mt.28:20), mas isso nunca impediu que milhões de cristãos fossem massacrados ao longo de dois milênios. Da mesma forma, Deus prometeu que guardaria a Igreja da tribulação (Ap.3:10), mas isso não vai impedir que hajam verdadeiros mártires na tribulação (Ap.20:4; 13:10).
Guardar é manter a fé intacta, dar forças para perseverar até o fim (Mt.24:13), para conseguir resistir ao anticristo e vencê-lo (Dn.7:21-26). Não é não ter que passar pela morte, se isso for necessário. Em Apocalipse 3:10, Jesus não está dizendo nada que vá além daquilo que oramos no Pai Nosso (Mt.6:13), daquilo que ele próprio orou com os seus discípulos (Jo.17:15), daquilo que ele disse sobre estar conosco para sempre (Mt.28:20), e também estará no tempo do fim. Mas isso nunca tirou qualquer cristão da terra – apenas o guardou do maligno (Jo.17:15).
• A segunda vinda é um “mistério”
Em 1ª Coríntios 15:51-52, o apóstolo Paulo disse:
“Eis que eu lhes digo um mistério: nem todos dormiremos, mas todos seremos transformados, num momento, num abrir e fechar de olhos, ao som da última trombeta. Pois a trombeta soará, os mortos ressuscitarão incorruptíveis e nós seremos transformados” (1ª Coríntios 15:51,52)
Os pré-tribulacionistas argumentam, baseados neste versículo, que a volta de Jesus era um “mistério”, e, se era um mistério, então não pode ter sido predita no Antigo Testamento. Mas tem um problema: a volta de Jesus foi, de fato, predita no AT! Os pré-tribulacionistas, então, resolvem esse “dilema” alegando que essa volta de Jesus é dividida em duas partes: uma secreta, antes da tribulação, que não foi predita no AT, e outra visível, depois da tribulação, que foi predita no AT.
Esse argumento pré-tribulacionista tem mais furos que um queijo mineiro. Em primeiro lugar, porque o próprio versículo utilizado por eles (1Co.15:51,52) não fala apenas da volta de Jesus, mas da ressurreição. Acontece que essa ressurreição é declarada de modo categórico em lugares do Antigo Testamento (Dn.12:2; Is.26:19), o que anula a tese de que a vinda de Jesus não possa ter sido predita em lugares do Antigo Testamento. Se a ressurreição é um mistério e foi predita, por que a volta de Jesus é um mistério que não possa ter sido predito?
Em segundo lugar, uma análise simples das vezes em que Paulo usou a palavra “mistério” extermina a crença de que isso se trata de algo que não possa ter sido predito no Antigo Testamento. Por exemplo: a salvação final de Israel, quando “todo o Israel será salvo”, Paulo considerou um “mistério” (Rm.11:25), mas, ao invés de dizer que isso é um mistério exatamente em função de não ter sido previsto no Antigo Testamento, ele faz exatamente o inverso: usa uma passagem do AT para provar isso!
“Irmãos, não quero que ignorem este mistério, para que não se tornem presunçosos: Israel experimentou um endurecimento em parte, até que chegasse a plenitude dos gentios. E assim todo o Israel será salvo, como está escrito: ‘Virá de Sião o redentor que desviará de Jacó a impiedade. E esta é a minha aliança com eles quando eu remover os seus pecados [Is.59:20]’” (Romanos 11:25-27)
A mesma coisa ocorre em Romanos 16:25-26:
“Ora, àquele que tem poder para confirmá-los pelo meu evangelho e pela proclamação de Jesus Cristo, de acordo com a revelação do mistério oculto nos tempos passados, mas agora revelado e dado a conhecer pelas Escrituras proféticas por ordem do Deus eterno, para que todas as nações venham a crer nele e a obedecer-lhe” (Romanos 16:25,26)
Paulo fala de um “mistério oculto” que foi dado a conhecer “pelas Escrituras proféticas” (AT). Ao invés de ser um mistério por estar oculto nas Escrituras, é exatamente o contrário: um mistério revelado nos livros proféticos do Antigo Testamento! Aos colossenses, Paulo diz que o mistério de Deus é Cristo (Cl.2:2), mas todo o capítulo 65 de Isaías é uma descrição profética de Cristo! Da mesma forma, João diz no Apocalipse:
“Mas, nos dias em que o sétimo anjo estiver para tocar sua trombeta, vai se cumprir o mistério de Deus, da forma como ele o anunciou aos seus servos, os profetas” (Apocalipse 10:7)
João diz que na sétima trombeta o “mistério de Deus” irá se cumprir, mas esse “mistério”, diz ele, não era algo que estava oculto dos profetas do Antigo Testamento; ao contrário, é algo que Deus “anunciou aos seus servos, os profetas” (Ap.10:7).
Paulo também disse que era um mistério que “mediante o evangelho os gentios são co-herdeiros com Israel, membros do mesmo corpo” (Ef.3:5,6), mas esse mesmo apóstolo citou textos como Isaías 65:1 (em Rm.10:20), Deuteronômio 32:21 (em Rm.10:19), Samuel 22:50 (em Rm.15:9), Salmos 117:1 (em Rm.15:11), Isaías 66:10 (em Rm.15:10) e Isaías 11:10 (em Rm.15:12) como textos bíblicos do Antigo Testamento que provam isso.
Ou seja: para Paulo, o fato de algo ser um “mistério” de jeito nenhum significa que o Antigo Testamento necessariamente se silenciou a respeito. Mas se o mistério é algo predito no Antigo Testamento, então por que é um “mistério”? Isso Paulo responde em 1ª Coríntios 2:6-8:
“Entretanto, falamos de sabedoria entre os maduros, mas não da sabedoria desta era ou dos poderosos desta era, que estão sendo reduzidos a nada. Pelo contrário, falamos da sabedoria de Deus, do mistério que estava oculto, o qual Deus preordenou, antes do princípio das eras, para a nossa glória. Nenhum dos poderosos desta era o entendeu, pois, se o tivessem entendido, não teriam crucificado o Senhor da glória” (1ª Coríntios 2:6-8)
É um mistério, não em função de nunca ter sido predito, mas em razão de que os “poderosos desta era” (i.e, os incrédulos, os céticos) não terem entendido. Tem a ver, portanto, com a falta de compreensão daquilo que foi dito, e não com não ter sido dito. Se não tivesse sido predito, Paulo não teria dito que eles “não entenderam”. Se não entenderam, é porque alguma coisa de fato foi dita, mas mal compreendida pelos incrédulos.
É esse o “mistério”: algo incompreensível aos não-cristãos, mas a nós revelado “pelas Escrituras proféticas” (Rm.16:26), nós que temos entendimento disso. Portanto, não há nada que obrigue a segunda vinda de Cristo a não estar presente de uma forma ou de outra no Antigo Testamento, ou que nos leve a dividir essa segunda vinda em “duas fases”, uma “misteriosa” e outra “não-misteriosa”.
• As Bodas do Cordeiro
Pré-tribulacionistas afirmam sem medo de errarem que a Igreja comemorará as bodas com o Cordeiro no início da tribulação, quando for arrebatada sete anos antes do fim. Como já era de se esperar, a Bíblia não diz isso em lugar nenhum. Mas Darby diz. Ele só não se preocupou com Apocalipse 19:6-7, que diz:
“E ouvi como que a voz de uma grande multidão, e como que a voz de muitas águas, e como que a voz de grandes trovões, que dizia: Aleluia! pois já o Senhor Deus Todo-Poderoso reina. Regozijemo-nos, e alegremo-nos, e demos-lhe glória; porque vindas são as bodas do Cordeiro, e já a sua esposa se aprontou” (Apocalipse 19:6-7)
Como vemos, o anúncio das bodas do Cordeiro ocorre somente em Apocalipse 19, depois de todas as tribulações apocalípticas, já que a grande tribulação termina no capítulo 18, com a queda da grande Babilônia. Se as bodas do Cordeiro são “vindas” (ou seja, estão próximas) em Apocalipse 19, depois da tribulação, é porque elas não ocorreram ainda. Qualquer ser pensante entende isso. Se eu digo: “a Ceia de fim de ano está próxima”, é porque eu não participei da Ceia ainda, senão ela seria um acontecimento passado, e não futuro.
Mas o texto pós-tribulacional de Apocalipse 19:6-7 não diz que as bodas já foram celebradas há sete anos, ao contrário: diz que as bodas ainda viriam a ser celebrada! Se no final da tribulação há o anúncio que as bodas estavam chegando, é porque elas só chegariam depois disso.
Portanto, a conclusão lógica que se chega é que Cristo comemorará as bodas conosco no milênio, depois que ele descer dos céus com os santos ressurretos, se encontrar com os vivos arrebatados e descer à terra, estabelecendo o reinado milenar. O que vai contra isso é pura lenda dispensacionalista, sem qualquer base bíblica e crida puramente por uma fé cega em Darby.
Paz a todos vocês que estão em Cristo.
Por Cristo e por Seu Reino,
Lucas Banzoli.
[1] Significado de “alarido” disponível em: <http://www.dicio.com.br/alarido/>.
[2] De acordo com a Concordância de Strong, 2752.
[3] BRASILINO, Gyordano Montenegro. Em resposta. Disponível em: <http://cristianismopuro.blogspot.com.br/2011/02/em-resposta.html>. Acesso em: 25/12/2013.
[4] O livro está disponível em versão impressa e também em e-book de forma gratuita, através do meu site, neste link: <https://lucasbanzoli.no.comunidades.net/index.php?pagina=1087350163>.
[5] Tácito foi governador da Ásia, pretor, cônsul, questor, historiador romano e orador. Escreveu sobre os cristãos aproximadamente em 64 d.C.
[6] Tácito, Annales, XV.44.
[7] Suetônio foi um escritor latino que nasceu em 69 d.C e era o historiador romano oficial da corte de Adriano, escritor dos anais da Casa Imperial.
[8] Suetônio, Vida dos doze Césares, n. 25, p. 256-257.
[9] Flávio Josefo foi o mais importante historiador judeu do século I.
[10] Antiguidades, 20.9.1.
[11] Caio Plínio Cecílio Segundo, mais conhecido simplesmente como “Plínio, o Jovem”, foi um orador, jurídico e governador imperial na Bitínia. Em suas cartas ao imperador Trajano ele confessa que já tinha matado muitos homens, mulheres e crianças que se diziam cristãos, e, em função dessa grande carnificina, tinha dúvidas se deveria continuar matando. O imperador respondeu que sim.
[12] Epístola X, 97.
[13] As referências completas, além de muitas outras, estão acessíveis em meu livro: “As Provas da Existência de Deus”.
[14] Os dados podem ser conferidos neste link: <http://www.gordonconwell.edu/resources/documents/gd16.pdf>.
[15] Dados disponíveis em: <http://noticias.terra.com.br/mundo/asia/coreia-do-norte-lidera-lista-de-perseguicao-aos-cristaos,3b086380c0ada310VgnCLD200000bbcceb0aRCRD.html>.
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